APAMT: médicos, advogados e juízes reunidos em evento inédito

A Associação Paranaense de Medicina do Trabalho promoveu no dia 4 de agosto o I Encontro Paranaense de Interfaces Periciais: Judiciária, Previdenciária e Trabalhista. Reunidos com o objetivo de melhor compreender e alinhar a atuação de todas as partes envolvidas nas perícias, médicos advogados e magistrados participaram de palestras e debates sobre o tema.

O período da manhã, dentro da temática previdenciária, iniciou com aula do juiz José Antonio Savaris, que falou sobre as dificuldades resultantes do fato de um mesmo problema oferecer respostas diferentes, quando deveriam ser similares ou condizentes. “Nós fomos tomados por uma especialização do saber, tanto na área médica como na jurídica, então quando olhamos o objeto por uma certa perspectiva acabamos perdendo a noção do todo. Precisamos ter uma integração que permita nos aproximar dessas questões e assim termos mais chances de chegar à verdade”, avaliou o palestrante.

Na sequência o médico ortopedista, Dr. Fernando Pessoa Weiss, falou sobre os critérios de incapacidade em doenças osteomusculares, apresentando as mais comuns nas perícias previdenciárias,sendo as mais expressivas as relacionadas a problemas de coluna, que englobam 60% dos casos, especialmente em pacientes com mais de 60 anos. Na sequencia vêm traumas e lesões de ombro. A partir da estatística, ele elenca os principais elementos analisados pelo perito para fundamentação do laudo pericial. “O laudo tem que ter consistência clínica, compreensão da profissiografia, exames clínicos e complementares, prontuários e atestados, com restrição aos atestados que não apresentam fundamentação técnica.”

No que diz respeito aos critérios de incapacidade de doenças mentais, o médico Psiquiatra e Perito Judicial, Dr. Carlos Augusto Maranhão de Loyola, citou os problemas mentais que podem ser causados por questões simples, como restrição de sono, e que tem inúmeras consequências como falta de atenção, irritabilidade, queda no desempenho profissional, restrição da volição, entre outros. Por isso sugere que a partir da percepção dos sintomas a pessoa procure fazer ajustes na rotina, como estabelecer horários para atividades profissionais e sociais, diminuir o ritmo, e buscar ajuda profissional quando necessário. Para o perito psiquiatra não há “receita de bolo” ou critérios objetivos que podem ser analisados e determinarão ou não a incapacidade por doença mental do paciente. Cada avaliação é individual e deve levar em conta o indivíduo e suas condições específicas.

A multidisciplinaridade inserida na determinação e análise da incapacidade, englobando diversas áreas do Direito, foi tema da aula do advogado Leonardo Zicarelli. Para ele, “é importante que o perito tenha muito claro desde o início quais os objetivos da perícia, assim como os conceitos jurídicos que envolvem aquela tese”. Com base no manual de perícias médicas do INSS, apresentou o conceito de incapacidade e citou os três pontos que devem ser considerados na análise e construção do laudo para determinação da incapacidade previdenciária, que são a condição clínica, as questões jurídicas e exigências profissionais. E destacou, entre outras questões, a importância do médico descrever a possibilidade de agravamento da condição.

A manhã teve ainda aula de Vivian Caroline Castellano, representando a procuradoria federal do INSS. Ela apresentou dados estatísticos de ações judiciais e benefícios concedidos, falou sobre perícia e destacou a importância de uma análise sempre o mais objetiva possível. Encerrando a primeira parte do evento, os palestrantes se reuniram em uma mesa-redonda e responderam perguntas dos participantes.

No período da tarde o tema trabalhista foi o foco das palestras, que iniciaram com o Dr. José Marcelo Penteado, médico perito, falando sobre a concausalidade em perícia médica ortopédica. Ele iniciou citando o índice OCRA e apresentou dados sobre trabalhadores que apresentam doenças osteomusculares em locais sem risco, portanto sem nexo, e sobre trabalhadores de locais com risco, cujas doenças têm, então, a possibilidade de nexo com o trabalho. Também explicou que as doenças podem ser originadas por uma associação de causas – diretas ou indiretas -, que podem derivar de fatores sociais, ambientais e individuais.

Na sequencia, o médico João Silvestre Silva-Junior trouxe aos participantes dados da previdência relacionados aos transtornos mentais e comportamentais, ao auxílio-doença e benefícios acidentários. Apresentou o resultado de um estudo que aponta as doenças mentais como a 3ª maior causa de afastamento do trabalho no país, ficando atrás apenas das doenças osteomusculares e lesões, envenenamento e outras ocorrências por fatores externos. Com relação ao nexo, explicou que ele pode ser profissional, individual e epidemiológico, porém frisou que “se é uma doença que não gerou incapacidade não há estabelecimento de nexo”.

O futuro das perícias médicas no contexto da reforma trabalhista foi o tema apresentado por Lourival Barão Marques Filho, juiz do trabalho. Ele apresentou dados mostrando que o número de acidentes de trabalho típicos vêm caindo ao longo das últimas décadas no país, mesmo com o aumento no número de trabalhadores, sendo o maior impacto na indústria. Segundo o palestrante, a reforma trabalhista do fim do ano passado também reduziu o número de ações trabalhistas. Foram 53,13% menos na comparação entre o 1º semestre de 2017 e o mesmo período de 2018. “Tivemos também uma alteração qualitativa nos processos pois a reforma trouxe desconforto para o demandante e a conclusão foi a diminuição da atividade pericial”, explicou.

José Affonso Dallegrave Neto, advogado, falou sobre a visão pericial pelo ponto de vista do trabalhador . Ele abordou a reforma trabalhista, que resultou em redução nas ações trabalhistas. “A nova legislação acabou com as aventuras jurídicas, o que foi positivo e pedagógico, porém acabou por espantar os trabalhadores que realmente têm um sofrimento e que agora têm receio de uma ação”, ponderou. Dallegrave também citou os índices que tendem a aumentar nesse período pós-reforma, como o aumento da terceirização e a redução dos intervalos, e seu impacto na vida do trabalhador.

Trazendo o contraponto da palestra anterior, o advogado Mario Dalcomuni Neto apresentou a visão pericial pelo ponto de vista do empregador. Ele elencou as possíveis responsabilizações pelos acidentes, a origem da doença, risco da função exercida, histórico profissional e familiar. Também indicou fatores a serem considerados na perícia, como redução da capacidade laboral e possibilidade de reabilitação, e sugeriu o que deve constar no laudo pericial que será apresentado ao juiz, sendo objetivo, abordando os quesitos de forma clara e focando nos fatores importantes para o juiz.

Os juízes do trabalho Valéria Rodrigues Franco da Rocha e Marcus Aurélio Lopes apresentaram o programa Trabalho Seguro, do qual são gestores no estado do Paraná, e que tem por objetivo investigar e propor soluções para o meio ambiente de trabalho com foco na promoção da saúde do trabalhador e prevenção de acidentes. “Nosso trabalho é colaborar com políticas públicas sobre SST, promover o diálogo social e institucional e a educação para a prevenção, assim como compartilhar de dados e informações para conscientizar”, explicou a Dra. Valéria.

Em sua fala, o Dr. Marcus ponderou que existe uma distorção daquilo que se acredita ser ou não seguro e que muitas vezes o senso comum é contrariado pelos dados estatísticos. Para isso ele utilizou o exemplo do uso de capacete para ciclistas. “Nós usamos dados para justificar a nossa perspectiva sobre a violência e acreditamos que quanto mais isso for debatido, mais as pessoas vão se convencer a importância de medidas preventivas.” Ele encerrou falando sobre o laudo pericial e da importância de ele ser o mais objetivo possível. “O juiz tem que encontrar uma solução. O foco na vítima não é uma questão técnica, é uma visão de mundo, então quanto mais objetivo, mais estarão contribuindo para as perícias”, concluiu.

A última palestra ficou a cargo do Dr. Gerson Zafalon Martins, representando o CRM-PR. Ele apresentou dados estatísticos de sindicâncias e processos instaurados no Conselho Regional de Medicina do Paraná relacionados às especialidades de Medicina do Trabalho e Perícia Médica e esclareceu que o CRM não tem ingerência sobre o resultado do exame médico pericial, foco de denúncias que por vezes são direcionadas ao órgão. O dia de aulas terminou com uma mesa-redonda entre os palestrantes do período da tarde.

Para o presidente do Encontro, Dr. Ricardo Del Segue Villas Boas, que é Diretor Financeiro Adjunto da APAMT, “o Encontro cumpriu seu objetivo de expor problemas dos profissionais das diferentes áreas e propor soluções e ações para a melhoria contínua da atuação de cada um dos envolvidos nessa tríade. Quem sabe assim conseguimos não só evitar conflitos, mas também dar um andamento mais célere às questões que envolvem a saúde do trabalhador. Ficamos muito contentes com o resultado do evento e o interesse que despertou tanto em médicos como em advogados e juízes que atuam na área”, comemorou Ricardo.

(Fonte: APAMT)

Por |2018-08-28T15:49:53-03:0013 de agosto de 2018|Eventos|Comentários desativados em APAMT: médicos, advogados e juízes reunidos em evento inédito