De Monalisa a William Waack: por que os jornalistas fogem da madrugada?

Na semana passada, dois jornalistas de TV pediram demissão de ótimos empregos com um motivo em comum: não aguentam mais trabalhar na madrugada. Monalisa Perrone, que trocou o Hora 1 da Globo pela CNN Brasil, exigiu em seu novo contrato uma cláusula determinando que não irá, em hipótese alguma, dar expediente entre meia-noite e 8h. Já Fabio Pannunzio deixou a Band, onde apresentava o Jornal da Noite, porque as jornadas até altas horas da madrugada não são compatíveis com sua necessidade de cuidar da saúde.

Monalisa e Pannunzio não são os primeiros a fugirem da madrugada. No ano passado, William Waack recusou uma proposta da Band porque o convite era para apresentar o Jornal da Noite. Uma decisão coerente para alguém que apresentou o Jornal da Globo durante 12 anos e chegou a reclamar no ar do horário tardio em que o telejornal era exibido.

Christiane Pelajo, que dividiu bancada com Waack, protestava que não tinha “vida social”, que não podia ir a jantares e festas. Muito antes deles, no longínquo ano 2000, Lillian Witte Fibe deixou o telejornal (e a Globo) atirando. “Nesse momento estou preocupada com a minha qualidade de vida. Não quero mais dormir durante o dia e viver à noite”, disse em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo.

Demitida pela Globo no fim do ano passado, após voltar de licença-médica, a apresentadora Izabella Camargo não têm dúvidas de que os seis anos e meio em que trocou o dia pela noite a levaram a desenvolver a síndrome de burnout, o ponto máximo do estresse profissional, desgaste emocional que danifica aspectos físicos e psíquicos da pessoa, reduzindo a naturalidade e a velocidade com que ela realiza  tarefas. Izabella chegou a ter um apagão no ar.

“Cada pessoa reage de uma maneira aos horários de trabalho. Tem gente que é mais diurna. Tem gente que produz melhor trabalhando mais tarde. Eu sempre gostei de acordar cedo. Entretanto, todos os médicos que entrevistei são categóricos e dizem que independentemente do perfil do trabalhador, inverter o ciclo circadiano, o ritmo do corpo humano que regula a produção de hormônios, é extremamente prejudicial”, diz Izabella, uma estudiosa do assunto.

Em suas pesquisas, a jornalista descobriu que inverter o ciclo circadiano “traz prejuízos que podem ser fatais”.

“Falo isso de acordo com a entrevista que fiz com a doutora Dalva Poyares, do Instituto do Sono, e com Andrea Bacelar, da Associação Brasileira do Sono. Mulheres que trabalham à noite têm chance de desenvolver mais rapidamente 84 doenças do que pessoas que trabalham de dia. E, se não me engano, 20% mais chance de desenvolver câncer”, enumera Izabella.

‘Meu sono é interrompido a toda hora’

Marcia Bandini, presidente da Anamt (Associação Nacional de Medicina do Trabalho) e professora da Unicamp (Universidade de Campinas), confirma que o trabalho noturno é um fator de risco para diferentes tipos de cânceres. Segundo a médica, a explicação para isso é que a troca do dia pela noite afeta todo o eixo neuroendócrino, o que reduz a imunidade.

Os efeitos do trabalho noturno são os mais variados, como “alteração no ciclo do sono-vigília, com dificuldade para dormir, sono encurtado ou sono não reparador; distúrbios do ciclo neuroendócrino, com aumento da pressão arterial e aumento da glicemia; além de distúrbios alimentares e gastrointestinais”, lista Marcia.

Os distúrbios que o trabalho noturno causa no sono são duradouros. Já faz quase 15 anos que o jornalista Sidney Rezende deixou de apresentar o Bom Dia Rio, o que exigia que chegasse à Globo todos os dias entre 3h e 4h, durante quatro anos e meio (2001-2005). “Até hoje acordo de madrugada, meu sono é interrompido a toda hora”, conta ao Notícias da TV.

Por causa disso, Rezende recusou em 2014 proposta da Globo para ser o primeiro apresentador do Hora 1. “Os distúrbios interferem na sua performance no ar, você troca palavra, alguém te chama durante a transmissão e você não percebe”, relata.

Âncora que vai substituir Monalisa Perrone no Hora 1, Roberto Kovalick vai usar a experiência de quem já foi correspondente da Globo no Japão, país com 12 horas de fuso em relação ao Brasil, para se adaptar à nova rotina de trabalho.

“Estou acostumado a não ter rotina, e essa é uma das coisas que mais gosto na profissão. Mas tomo alguns cuidados, cuido da alimentação, pratico atividade física. Além disso, conto com o apoio fundamental da minha mulher, já que isso envolve uma mudança na rotina da casa”, disse em entrevista divulgada pela Globo.

(Fonte: Notícias da TV)

Por |2019-09-10T11:00:22-03:0010 de setembro de 2019|Saúde no trabalho|Comentários desativados em De Monalisa a William Waack: por que os jornalistas fogem da madrugada?